Uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) abre um precedente importante sobre os chamados “honorários amigáveis” ou “honorários administrativos”. Esta cobrança, “amigável” apenas no nome, é exigida por algumas prefeituras quando o contribuinte perde uma discussão administrativa. O valor fixado é de 10% sobre o total da dívida, com o adicional já lançado e emitido na guia de pagamento.
Os “honorários amigáveis” vigoram em São Paulo e também em municípios do interior paulista, como Campinas, Valinhos e Vinhedo. Em muitos casos, esta cobrança é feita antes mesmo que o contribuinte seja inscrito na dívida ativa ou tome ciência do ajuizamento de execução fiscal.
Há vários episódios que valem a pena ser relatados aqui até a decisão do TJSP.
Tudo começou com uma empresa do setor de locação de imóveis, autuada por pagamento a menor de Imposto Sobre Serviços (ISS). Após perder a discussão na esfera administrativa – e sem ter sido inscrito na dívida ativa – o contribuinte recebeu também a cobrança dos “honorários amigáveis”. Recorrendo a um escritório de advocacia, a empresa alegou falta de previsão legal para efetuar o pagamento dos 10% adicionais sobre o valor da dívida.
Pelo fato de o contribuinte não ter ido para a dívida ativa de São Paulo, e como não houve trabalho da procuradoria do município, a cobrança dos honorários não se justificava. No entanto, no pedido negado em primeira instância, a decisão mencionou previsão legal no Programa de Parcelamento Incentivado (PPI), de 2017. Coube então à defesa da empresa recorrer ao TJSP alegando que a norma não se aplicaria, justamente por não envolver qualquer tipo de parcelamento.
Eis aqui uma curiosidade. Na época em que a ação foi ajuizada pelos advogados da empresa, havia previsão legal para a cobrança somente na esfera federal, a partir do artigo 1º do Decreto-Lei nº 1025/1969, que estabelecia 20% de “encargo legal”. A cobrança foi alterada pelo artigo 3º do Decreto-Lei nº 1569/1977 e passou a 10%.
No Tribunal de Justiça, a 15ª Câmara de Direito Público foi unânime a favor do contribuinte. Vale destacar aqui a manifestação do relator, desembargador Rezende Silveira. “Como é sabido, não há nesta fase do procedimento administrativo, a presença do procurador municipal que justificasse a cobrança de ‘honorários amigáveis’”. Ele continua, dizendo que a prefeitura “não poderia incluir (no boleto de pagamento) honorários, por ausência de atuação de procurador municipal nesta etapa”. O desembargador lembra ainda que os débitos tributários não estavam incluídos em qualquer acordo de parcelamento, “nem tampouco foram objetos de ajuizamento de execução fiscal, o que, aí sim, justificaria a cobrança de honorários advocatícios” (apelação nº 1023158-44.2019.8.26.0053).
Embora a Prefeitura de São Paulo tenha recorrido da decisão ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), a 1ª Turma negou provimento ao recurso. O entendimento é de que envolveria reexame de provas, que é vedado aos ministros. No dia 17 de julho, o processo transitou em julgado, não cabendo mais recurso.
O que ocorre a partir de agora?
Com o trânsito em julgado, a empresa fará o levantamento do depósito judicial. Como os valores da autuação neste caso eram altos, agora o contribuinte poderá reaver 10% que estavam sendo cobrados indevidamente.
Em nota, a Procuradoria Geral do Município de São Paulo (PGM-SP) informou que o processo está em fase de cumprimento.
Nunca é demais ressaltar que a decisão do TJSP é um precedente para que o contribuinte questione e seja beneficiado pelo não pagamento desta cobrança desprovida do que é fundamental: a previsão legal, expressa de forma clara e justa.
*Leandro Nagliate – OAB/SP 220.192. Advogado formado em 2003 pela PUC de Campinas, é especialista em direito previdenciário e tributário. Leandro é sócio da Nagliate e Melo Advogados, em Campinas (SP).
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